Gene Hackman e o trajeto da invisibilidade na caminhada do tempo

 

A morte do ator Gene Hackman fez-nos refletir que, neste mundo da inteligência artificial, nos aprisionamos no digital e não temos tempo para o contacto pessoal.

Estamos encapsulados por conhecimentos e envenenados de informação sem tempo para a emoção.

É preciso uma consternação para nos chamar à razão, frear a automatização, dar espaço ao sentimento.

Mas o que é esse tempo?

Tempo que falta. Tempo que nos rouba tempo. 

Tempo que nos faz deslizar pelo passado, tropeçar no presente e cair no futuro de um tempo inexistente.

Tempo, bom ou cruel, que se encurta proporcionalmente ao envelhecimento e, ao mesmo tempo, torna-se infinito quando não importa mais ter tempo.

Tempo que nos torna invisíveis diante da falta de tempo no novo tempo.

O  triste e inesperado final do ator e a sua esposa expôs essa  realidade do trajeto tempo na caminhada da invisibilidade para todos que desafiam percursos de longa distância de vida.

A cada passada em direção ao sprint final, o último suspiro muitas vezes passa despercebido, seja abandonado num asilo ou num leito de hospital, ou até mesmo bem instalado na sua própria residência.

Nesta trilha do envelhecer não existe diferenciação. Cada passo adiante conduz a solidão do anonimato.

É preciso cruzar a tênue linha entre viver e morrer para ter chance de fazer a invisibilidade desaparecer e o tempo, que antes faltava, fazer–se presente.

A efemeridade de uma existência

 

Mas a questão não é a efemeridade de uma existência.

De forma poética, flores desabrocham numa beleza ímpar para em seguida despetalar. 

Folhagens passam do verde ao vermelho, colorindo a paisagem antes de amarelar, tombar e secar.

São árvores e campos desnudados anunciando o fim e um novo recomeçar.  Assim é a vida em constante movimento que a todo momento renasce com outra roupagem.

O triste é deixar a correria urbana cegar e distanciar.

É não ter tempo de cultivar bons momentos e acumular histórias para eternizar.

Triste também é constatar que, hoje, somos parte desse descartável, inclusive numa área que antes preponderava os sentimentos e sentidos. 

Em 2017, publicamos no blog o texto O caminho do lixo na Era Digital. Já se passaram quase oito anos e a perecibilidade tem ganhado espaço nessa caminhada ao futuro.

Será que nessa contradição existencial ainda há esperança de encontrar tempo para um equilíbrio entre o real e virtual?

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