Acordei com o joelho reclamando e decidi dar um descanso de corrida. Iria fazer algo mais leve. Decidi conhecer Hyères. Sem estar programado, sem roteiro, simplesmente fui. Hyères fica a cerca de 32 km de Sanary e a 20 km de Toulon, ou seja, mais perto que Marseille, que fica em torno de 50 km. Indo de trem, leva uns 35 minutos. Mas, como é aquele perto que usualmente não se vai a pé, acaba sempre ficando na lista do “a qualquer hora eu vou” e corre o risco de não acontecer.
Do pouco que havia pesquisado há mais tempo sobre a cidade, lembro-me que a maioria dos depoimentos era sobre uma passagem rápida rumo a Porquerolles, uma ilha que é uma das grandes atrações do local e que tem programação de saídas, via mar, de diversas cidades no entorno, inclusive Sanary. Eu não iria a Porquerolles, não desta vez.
Ao descer na estação de trem, procurei como primeira parada o Office de Tourisme da cidade. Comecei assim minha caminhada da estação ao Office, atravessando Hyères de uma ponta a outra e descobrindo locais e ruas aprazíveis. Ainda no Office, a constatação de opções de diferentes circuitos: história, arte, praias, trilhas do litoral, salinas e as ilhas, com uma variedade de percursos para agradar a qualquer gosto. Escolher seria missão quase impossível. Fui por eliminação. Me solidarizei com meu joelho reclamão eliminando as trilhas de aventura. Decidi fazer os circuitos Ville Haute e Hyères XIX siècle, que me permitiam viajar pela história da cidade através dos séculos.
Com o mapa nas mãos, dei partida começando pelo circuito da parte alta da cidade. Para mim, seguir a indicação dos mapas é sempre uma diversão a parte e me faz sentir de volta à infância, em uma caça ao tesouro ou mesmo gincana ao cruzar com tantos outros turistas também com seus mapas e muitas vezes com ar de perdidos. Às vezes, uma simples troca de olhar dá margem a diferentes interpretações, conforme o momento. Viajando na imaginação vou vencendo as etapas, me divertindo, embora só, mas com a sensação de fazer parte de um grupo.
A igreja medieval de Saint Louis, do século XIII, com seu estilo romano gótico, primeiro dos 15 pontos turísticos apresentado no circuito, dá a certeza de estar começando sua viagem no túnel do tempo e da história de Hyères. Mas é o segundo ponto, Porte Massillon, século XIV, com seu imponente relógio, a porta aberta para entrar, descobrir, aprender e admirar tudo que lhe reserva a parte alta da cidade. Pelas ruas estreitas, lojas de diferentes produtos se misturam. Todo o percurso é sinalizado com placas que informam a direção e tempo previsto até cada local. Do período medieval ao século XX, com torre, passagens, praças, jardins, casas típicas de séculos passados, castelos e ruínas de castelo, a caminhada leve que idealizei fazer em consideração ao joelho, passa ao status de uma atividade de esforço, levando em consideração o sol quente do início de tarde.
No castelo de Sainte Claire, uma parada para conhecer o local que abrigou duas celebridades em épocas distintas, ponto perfeito para pausa na tranquila paisagem verde com uma linda vista de Hyères. Daquele ponto até as ruínas de um castelo, uma subida respeitável e em terreno acidentado, que só fui descobrir o real significado de um aviso em letra miúda no mapa (circuit en pente avec sol accidenté/ prévoir des chaussures adaptées), na hora da descida, depois de conquistar o ponto mais alto do circuito.
O piso, uma mistura de pedregulhos e terra, mais parecia uma pista para rolar ladeira abaixo. Embora um jeito um tanto estranho, a técnica adotada foi a descida de lado e sempre me apoiando nos locais possíveis nas laterais para não dar o vexame do tombo. Nunca se sabe se vai cruzar com alguém. E, nesse momento, eu rezava para que não. O joelho nessa hora estava aquecido, compreendeu meu sufoco e foi parceiro de aventura, mesmo que não tenha entendido direito minha definição de percurso leve.
Depois do teste de resistência, era circuito praticamente terminado, com direito a uma rápida parada em mais um jardim de plantas. A previsão de tempo gasto para o trajeto, indicada no mapa é de cerca de 1h30. Acredito ser possível, sem erros pelo caminho e muitas ou extensas paradas. Eu percorri em torno de 2horas. De volta ao Office, para descansar o corpo, enquanto recarregava a bateria do celular para encarar o segundo circuito do dia, que será assunto para o próximo post.
Para saber mais:
O Castelo de Sainte Claire, antigo convento das Clarissas, reformado por Olivier Voutier, no século XIX, também foi residência de inverno da escritora americana Edith Warthon, de 1920 à 1937, que foi conquistada pela paisagem e clima ameno de Hyères, que, segundo relatos históricos sobre a cidade, é considerada uma das mais antigas estações de inverno do mundo.
O coronel Olivier Voutier foi o oficial da marinha francesa que descobriu a estátua da Vênus de Milo. Segundo relatos históricos, Voutier visitando um sítio arqueológico nas ilhas gregas, que era objeto de escavações, presenciou a descoberta da Vênus de Milo feita por um camponês. Ciente da importância da descoberta, intermediou a negociação para a compra da estátua, que teve um caminho longo até chegar ao acervo do Museu do Louvre.
Edith Warthon, autora do livro The Age of Innoncence, Prêmio Pulitzer de Ficção em 1921, que alugou o castelo para passar as temporadas de inverno. No entorno do castelo, criou um jardim de 6.500 m2, hoje, Parc Saint Claire, com espécies subtropicais da Austrália e América do Sul.
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Parece lindo prima. Que cor de ceu. Que ele traga bons ventos.
Adorei o passeio!
Bj.