A distância e o tamanho da aventura

vista da trilha

É muito difícil voltar a manter o hábito de correr diariamente. Nas primeiras semanas, e tanto faz se corredor iniciante ou retomando a atividade depois de um tempo, o corpo reclama e a mente parece não querer ter o trabalho de convencer.

Escolhi o trajeto do Port de Sanary até a entrada da Île du Gaou para avaliar minha performance em quilometragem e tempo. A proposta era fazer direto o trajeto de ida, em torno de 6 km, e, durante a semana, gradativamente aumentar a quilometragem de retorno correndo. Assim, eu faria cerca de 12 km diários, alternando corrida e caminhada, em planos, subidas e descidas, até completar todo o percurso apenas correndo.

Parc de la Mediterranée
Parc de la Mediterranée

O percurso tinha a vantagem de já ser conhecido e  ser maior a possibilidade de vencer a tentação de possíveis paradas para registros. Apesar do sol forte, surpreendentemente, cheguei sem perceber a Gaou. Acho que as lembranças contribuíram para me distrair.

Para cada lado que olhava tinha um trajeto e uma aventura.  Cap Nègre, Parc de la Méditerranée, Espace Naturel et Sensible du Monte Salva e a própria Île du Gaou, na qual, nessa época do ano, encontrei um outro cenário. A ilha agora também passava a ser point de famílias, casais e até cachorro que se divertia em um dia de sol e mar.  No retorno, mais uma lembrança ao avistar uma entrada quase que escondida. Era mais um trecho da trilha Le Brusc, entre as praias du Cros e de la Coudoulière.

Enseada na Île de Gaou
Enseada na Île de Gaou
Cachorro nadando na Île du Gaou
Cachorro nadando na Île du Gaou

No dia em que entrei nessa trilha, eu retornava de uma corrida até Gaou, quando parei para amarrar o tênis, e vi a placa, quase coberta pela vegetação, apontando para um beco. Mais adiante, um casal foi o meu sinal verde para bisbilhotar o local. E, fui entrando, sempre procurando estar próxima dos dois.

A vista era fantástica e atrativa, mas aquele medo de só ter o mar como companhia, principalmente em trechos de maior dificuldade, ainda estava fresco na memória. Por ser parte da mesma trilha Le Brusc, tinha muita semelhança na beleza e na proporção do medo causado.

O fato de ter conseguido chegar ao final daquele trajeto, me empurrava para frente. Em um dado momento, achei ser final de linha. Era só mar. Ali, aprendi com um senhor que era preciso contar três ondas e cruzar rapidamente sobre as pedras. Nem pensei. Obedeci. Corri. Consegui! Segui adiante sem perceber que o casal optou por retornar.

A partir daquele ponto, mais uma vez, era eu, o mar, as pedras escorregadias e um trajeto estreito.  Eu precisava estar atenta para atravessar, colada nos muros, e de olho nas possíveis ondas. Naquele momento, a dúvida de prosseguir ou retornar. Naquele momento, a lembrança de ter que enfrentar novamente o trecho das três ondas, só que agora sozinha.

Por alguns minutos, cheguei a ter raiva da coragem desnecessária.  Só queria chegar em algum lugar. Tentava mentalmente visualizar o trajeto da Plage du Cros à Plage de la Coudoulière, pelo asfalto, e acreditar já ter passado da metade do caminho.

Foi depois de uma curva, ainda no estreito e escorregadio caminho, que avistei, com satisfação, uma placa que informava a interdição de parte da trilha e uma opção de saída, atravessando um condomínio de casas. Respirei aliviada.

Ainda existia a possibilidade de retornar à trilha, mais adiante, e completar o percurso até a Plage de la Coudoulière. Não foi minha opção. A recarga de adrenalina e de coragem já era suficiente por aquele dia. Só queria chegar em casa e relaxar.

Esse pequeno trecho da Le Brusc me deu a certeza de que quando trata-se de trilhas, distância não é medida para o tamanho da aventura. Quem sabe depois que os piores momentos tornarem-se apenas boas lembranças de uma grande aventura e vista deslumbrante, eu resolva concluir o trecho da trilha.

Acho que, inconscientemente, tenho feito das trilhas meu remédio para enfrentar os momentos em que o caminho a seguir está repleto de desvios.

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