Caminhada do Tempo ou Tempo para enxergar

Café da manhã na Quai Charles de Gaulle em Sanary sur Mer

 Depois de uma semana brigando com tempo que parece a cada dia diminuir só para me provocar. Depois de uma semana dedicada a resolver problemas, finalizar trabalhos e não conseguir conciliar tudo isso com uma corrida regular. Depois de uma semana de chuva, enfim, uma segunda-feira, que amanheceu com um céu azul, parecendo um bom agouro. Acordei disposta e sai de casa decidida a caminhar sem rumo.

É isso mesmo: caminhar. A idade, o estar sozinha e bem distante de todos, me faz mais cautelosa. Vários dias trabalhando sem ter um local adequado, abusando da má postura e castigando a coluna e o joelho. Era necessário ter bom senso. Um trauma não será bem-vindo. Com o passar dos anos, por mais que tenha um bom preparo físico, eu sei que a resposta do corpo é mais lenta. É verdade, mas, somado a tudo isso, vem a preguiça, a procrastinação oportunista típica de momentos nos quais interrompemos a regularidade de uma atividade física, seja qual for o motivo. É como se o corpo e, principalmente, a mente ficassem pesados. Não me aprofundo em qualquer explicação científica e nem sei se é comum a todos. É fato que comigo é assim que acontece. E, a corrida tem sido uma boa escola ou um retrato de minha vida. Um dia estou preparada para enfrentar terrenos desconhecidos e distâncias enormes. Em outro, o recomeçar.

E, assim, sem a pressa, que me é habitual, comecei minha caminhada.  Enfeitiçada pela energia do sol, cheguei a esquecer o tempo, os trabalhos ainda por fazer e as decisões a tomar. Apenas queria caminhar, apreciar e deixar os pensamentos fluírem sem um comando. Para mim, uma autoterapia.

Enfeitiçada pela energia do sol, cheguei a esquecer o tempo

A cada passada, um olhar diferenciado sobre o cotidiano de um início de semana em Sanary-sur-Mer. O bom papo do café da manhã no bar ou no banco da orla, apreciando a beleza do mar. O passo apressado em direção ao trabalho ou ao ponto turístico da cidade. Assim, com um critério bem próprio, classificava e imaginava a vida das pessoas, que cruzavam o meu caminho, na manhã de primavera ensolarada. Um passatempo que aprendi, quando criança, com meu pai, e que sempre me pego a praticar.

 

O trajeto do Port de Sanary até a escada de acesso ao Chemin de La Colline, que apelidei de escada da penitência, não é longo e já bem conhecido. Inúmeras vezes foi meu início de percurso, mas, hoje, parecia querer mostrar, além do que eu já havia visto. Ainda no Centre de Ville, uma parada, um registro de uma pequena e estreita rua com uma jardineira florida ao fundo, que na foto, de um celular, fica difícil de identificar.

escda no final da Corniche des Baux em Sanary Sur Mer
escda no final da Corniche des Baux em Sanary Sur Mer

No final da Corniche des Baux, em frente a escada da penitência uma grande descoberta: a trilha do litoral de Sanary, um trajeto beirando o mar. Uma placa no início do percurso alerta sobre riscos e cuidados e sinaliza os pontos de acesso  em tempo e quilometragem. A opção de um caminho até a praia de Portissol, beirando o mar, era um convite, mas, que não me deu coragem suficiente para experimentar. Só de olhar as pedras, as curvas, os trechos estreitos e a proximidade do mar, lembrei-me da terrível sensação de medo e da necessidade de ser prudente estando sozinha.  Quem sabe, eu possa tentar em outro dia, mas, deixo a dica para alguém mais corajoso. Sem trilha, parti em direção à escada, minha velha conhecida. Uma, duas, três subidas, ou 345 degraus, foram suficientes para obter a sensação de ter resgatado o condicionamento físico. O poder da mente é fantástico e sempre me surpreende .

Era hora de pegar o trajeto de volta para casa com um último registro do colorido da estação no Impasse Lou Simai, em Portissol. Esse enxergar o que vê acabou sendo o meu tema de reflexão na caminhada. Quantas vezes deixamos passar despercebidos lugares e fatos que estão ao nosso redor. Falta de tempo ou exagero de confiança por achar ter tempo de sobra.

Em Sanary, estou me descobrindo com a sensibilidade de um fotógrafo nunca, por mim, imaginável. Constato, também, o tempo que perdi, os registros que não fiz por onde passei, incluindo uma das mais belas cidades do mundo: Rio de Janeiro. Faltou inspiração? Não. Faltou segurança? Talvez. Faltou tempo? Sempre. Eu precisei viajar e deixar despertar a minha curiosidade de turista para descobrir um novo olhar, só que em outro lugar.

Comments

  1. Cristina says:

    Experiências só possíveis quando você está só consigo mesma. Continuo acompanhando com prazer os seus novos caminhos. bjs

  2. Beatriz says:

    Vi querida,
    Acompanhando e adorando sua aventura!!!!
    Caminhar também é muito prazeroso… Eu agora só caminho….hehehe…
    Saudade…..beijos….

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